É pagar pra ver – A tv por assinatura em foco é um livro publicado pela Summus Editorial em 1996. O autor Luiz Guilherme Duarte divide seu estudo com base em dois grandes assuntos: a TV Por Assinatura, como o título do livro induz, e a segmentação da programação da televisão brasileira (aberta e por assinatura).
O texto base do livro foi escrito em 1992 e revisto em 1996, para publicação. Em diversos momentos observa-se questões que estavam em aberto mas que foram resolvidas no intervalo de 4 anos entre a redação e a publicação. Num primeiro momento pode causar estranhamento, mas ao longo da leitura faz sentido a manutenção do texto original e da atualização: ressalta-se assim uma evolução da mídia entre o período até a efetiva publicação.
O livro é dividido em 6 capítulos. Inicia com o conceito de televisão segmentada, passa pelo mercado original (pré-segmentação e pré-tv por assinatura) nos EUA e Brasil, analisa as redes de televisão, as tecnologias de transmissão, a segmentação nos canais de tv aberta e por assinatura e a segmentação da audiência da televisão.
A comparação entre a EUA e Brasil
A TV por assinatura surgiu nos Estados Unidos como uma tecnologia que permitiu melhor recepção do sinal de televisão aberta. Na década de 1970 houve a percepção por parte de alguns empresários de que a tv a cabo (modalidade de tv por assinatura) seria algo maior do que a simples distribuição do sinal de televisão aberta. É daí que são criados os conceitos de canais fechados (pagos), super-estações (superstation, como a TBS da Turner – que unia em sua programação filmes antigos e esportes), e canais segmentados em filmes (HBO), esportes (ESPN), Notícias (CNN) e música (MTV).
O autor também analisa as tecnologias de distribuição dos sinais de TV por assinatura, como é o caso da tv a cabo e dos canais de UHF codificado (o que, no mercado americano, recebia a sigla de STV). A análise passa pelos fatores histórico-sociais e pelas características e limitações das tecnologias.
A TV por Assinatura no Brasil
Após conceituar as tecnologias de televisão por assinatura e a evolução no mercado americano, Duarte aborda o mercado brasileiro.
A partir deste ponto, o livro torna-se um relevante registro histórico de um período muito rico e pouco explorado em obras sobre a televisão brasileira.
Assim como em “Tv por assinatura: 20 anos de evolução”, obra já analisada neste portal, o autor de “É pagar pra ver” faz um registro de operadoras locais de tv por assinatura e de operadoras que tiveram pouco tempo de mercado, como foi o caso da PluralSat (operadora via satélite com conteúdo de canais alemães e franceses), TV Alpha (esportes e filmes adultos) e Canal+.
Imagens do Canal+ - 1989 Fonte: YouTube / Canal Alex Nicolau
https://www.youtube.com/watch?v=mItImy601pg&list=PLn75NVFgnTYwYqAMKadWY3penh-yOo_Y8&index=5
Registro da TV Alpha (a partir de 02:09) Fonte: YouTube / Canal Alex Nicolau
Outro registro histórico importante trazido pelo autor é quanto a tecnologia adotada no Brasil e os processos de escolhas destas tecnologias para a distribuição da tv por assinatura.
A Tv segmentada
A principal essência do livro é o conceito de segmentação da programação de televisão, seja ela aberta (pública, gratuita), ou por assinatura (tv paga, tv fechada).
A partir de conceitos discutidos por Kotler, Ries &Trout, Luiz Guilherme Duarte avalia os conceitos de TV Generalista (cuja programação procura atingir a maior parcela de público possível, com conteúdos que agradem a essa grande audiência) e o contra-ponto proposto pela TV Segmentada (na qual o público é definido por diferentes critérios e a programação é estruturada com base no perfil de público pretendido).
No Brasil os primeiros registros de segmentação da programação são datados da década de 1980. O surgimento das redes Manchete (1983, com programação elitista voltada às classes sociais A e B) e do SBT (1981, com programação popular voltada às classes sociais C, D e E), foram marcos nacionais na segmentação por classe social. Pelo conteúdo da programação a Rede Bandeirantes segmentou sua programação com base no esporte a partir de 1983, após fechar parceria com a empresa “Luqui Produções”, cujo um dos sócios era o narrador Luciano do Valle (1947-2014).
A citação à Luqui não é por acaso. A empresa conseguiu a concessão de um canal em UHF em São Paulo, ao qual pretendia transformá-lo em um canal aberto esportivo. Uma parceria quanto ao canal foi feita com a Bandeirantes, que o lançou em 1996 com outra segmentação: a de uma programação local voltada para a cidade de São Paulo. Foi assim que nasceu o canal 21, que até 2001 manteve sua vocação original. Desde então é um canal secundário da Rede Bandeirantes e atualmente encontra-se arrendado à Igreja Universal.
https://www.youtube.com/watch?v=ImOP9Md08GM
Trecho do programa "Circular", do Canal 21 (1999), gravado dentro de um onibus nas ruas de São Paulo. Fonte: YouTube / Canal "FilmesVHS".
O Canal 21 quando saia do ar, transmitia a "TV Fish", uma relaxante imagem de peixes em um aquario. Fonte: YouTube / Canal "Pisa Leve"
Ainda na linha do registro histórico, “É Pagar pra ver” aborda os canais em UHF que estavam em operação no início dos anos 1990 e os que seriam lançados na sequência.
Dentre esses canais, vale o registro à TV Jovem Pan, canal 16 UHF. A TV teria a programação segmentada em Esporte e Jornalismo, baseado no perfil da Jovem Pan AM. Problemas com sócios fizeram o canal abortar seu projeto e a Jovem Pan a sair da sociedade. Na época do estudo, a Jovem Pan estava expandindo seu sinal pelo interior paulista e para todo o país, via satélite. Quando o livro foi lançado, a TV já tinha sido rebatizada como CBI (Canal Brasileiro da Informação, justamente o slogan da TV Jovem Pan) e arrendado sua programação ao programa de televendas Shop Tour.
Intervalo comercial da TV Jovem Pan (canal 16 UHF) em 1991. Fonte: YouTube/Canal "Êgon Bonfim"
Encerramento da programação da TV Jovem Pan em 1991. Fonte: Youtube/Canal "Juan Pablo Fernández Rauch"
A Rede Mulher, com programação segmentada ao público feminino, também foi abordada no livro. A rede foi comprada por Edir Macedo, da Record, em 1999 e transformada em Record News (segmentada em jornalismo) em 2007.
Coletânea de Vinhetas da Rede Mulher e Record News. Fonte: YouTube (Victor Luiz Channel)
A segmentação pelo conteúdo jovem e musical foi a tônica da TV Abril, que fechou um acordo de licenciamento com a Viacom e lançou em outubro de 1990 a MTV Brasil (Canal 32 UHF São Paulo). Ao lançar a sua programação, a MTV Brasil precisou investir em videoclipes nacionais, pois até então apenas a Globo, no Fantástico, produzia regularmente o formato de clipes musicais.
Primeiros momentos da MTV no dia de seu lançamento. Fonte: Youtube / Canal Denny Design
Por fim, Duarte cita experiências locais de TV Segmentada nas cidades de Guarulhos, Osasco, Mogi das Cruzes, São Caetano do Sul e Santo André (com a TV Diário do Grande ABC – cuja história daria um livro à parte).
Sobre o Livro:
É pagar para ver: a TV por assinatura em foco faz parte da coleção ‘novas buscas em Comunicação’ da Summus Editorial. Publicado em 1996, tem 208 páginas e pode ser encontrado em sebos (como na Estante Virtual).
Professor universitário desde 2005, é mestre em comunicação e especialista em criação visual e multimídia. Trabalhou em importantes faculdades e colégios técnicos de São Paulo e Santo André. Radialista de formação, teve passagem por emissoras de TV e Produtoras de TV e Internet. Atualmente dirige a TeleObjetiva e coordena os cursos de Rádio, TV e Internet; Produção Audiovisual e Fotografia da FAPCOM, além da comissão própria de avaliação (CPA) da instituição.